Recebi o texto abaixo de colegas de trabalho, e por se tratar de algo que já corre em redes sociais, registrei aqui para reforçarmos todos, os cuidados com a pandemia de COVID-19, a despeito das sandices perpetradas quase que diariamente pelo Presidente da República.
Certamente se refere a republicação de entidade sindical que teve acesso ao Desembargador, que finaliza com a mensagem da autoridade e menciona correção de ordem gramatical.
Ao que foi recebido, portanto, com uma derradeira revisão.
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Desembargador do TRT-2 faz alerta dramático sobre riscos de audiências presenciais na pandemia
Post published: 23 de dezembro de 2020
Rafael Pugliese teve caso grave de COVID-19 e enviou mensagem a colegas de magistratura que circulou em grupos de WhatsApp.
Vice-presidente judicial da última gestão no Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região, o Desembargador Rafael Pugliese Ribeiro redigiu uma alerta dramático sobre os riscos que a retomada das audiências presenciais no Regional podem representar para a saúde pública, dos servidores, magistrados e jurisdicionados.
Acometido por um quadro grave da COVID-19, o Desembargador já se recupera em casa, mas retornou nesta terça-feira (22) a um contato da reportagem informando, via assessoria de comunicação do TRT-2, que “meu caso foi grave. A minha recuperação será longa. Há 45 dias eu corria 8km por dia, todos os dias. Anteontem eu fiz uma caminhada de 300 metros, com duas paradas para descanso. Tudo precisa ser planejado. O simples ato de se levantar do sofá precisa ser calculado. Ao menor movimento mais brusco, surge o déficit de O₂.”
Muitos servidores no Estado e no país já relataram situações assim. Agora, o depoimento de um Desembargador, além de ganhar repercussão, evidencia que o vírus faz vítimas em todas as classes sociais, regiões e perfis socioeconômicos (ainda que as desigualdades sociais venham levando à maior letalidade entre a população negra e pobre). Os trabalhadores na ponta do atendimento nos serviços públicos, por óbvio, estão ainda mais expostos e mais sujeitos a uma exposição desnecessária que deve ser reavaliada.
O Sindicato voltou a pedir a suspensão da retomada do expediente presencial nos tribunais, tendo em vista o recrudescimento da epidemia nas últimas semanas e o cenário projetado para o início do próximo ano (leia aqui).
A mensagem do Desembargador Rafael Pugliese destinava-se a colegas de magistratura, mas como sabido, perde-se o controle do que circula no WhatsApp. Por isso, o Sindicato buscou comprovar a autoria da postagem e solicitar autorização para reprodução no site, mesmo com o conteúdo já tendo sido tornado público.
O testemunho detalhado de quem viveu – e sobreviveu – aos efeitos da COVID no organismo deve ser avaliado por cada juiz, Desembargador e servidor (que tem a greve sanitária como mecanismo de luta contra a obrigação de se expor ao vírus).
Leia abaixo o relato do Desembargador:
Audiências Judiciais Presenciais
Colega,
Você é daqueles que estão com saudades das audiências presenciais e pretende reiniciar as pautas no Fórum?
Se sim, com certeza você não enfrentou os efeitos sérios de uma contaminação por COVID-19, nem viu alguém próximo sofrendo por enfrentá-la. Você não sabe o que é oxigenação de 90%. Você não sabe o que é uma cama de UTI, 4 dias na UTI, nem sabe o sofrimento que existe numa internação hospitalar de 14 dias em área de isolamento com: 15 coletas de sangue de veia, 1 coleta de sangue de artéria (informe-se sobre o que se sente na coleta do sangue de artéria), 30 injeções de anticoagulante, 4 tomografias, 2 raio-X, vários antibióticos (pingando por 4 horas, 3 vezes ao dia, na veia, controlado por máquinas), 80 mg de corticoide por dia, vários outros medicamentos (protetores gástricos, antidepressivos, indutores de sono, relaxantes, anti-inflamatórios, xaropes, antitérmicos), substituição dos “acessos” à veia a cada 4 dias, perda de 10 kg em duas semanas, perda de massa muscular, falta de forças físicas para coisas simples como simplesmente tossir ou assoar o nariz, 30 exames de glicemia, monitoramento de função renal, monitoramento cardíaco, necessidade de aporte de oxigênio, quase três dias sem dormir, alucinações, fisioterapia respiratória diária, controle de sinais vitais a cada 4 horas, tudo cercado de um mundo de incertezas sobre o que pode acontecer.
Se você precisar de “ventilação mecânica”, tudo piora. Será necessária a sedação para a introdução do tubo na traqueia, e outros dois tubos para as suas funções, e poderá ser necessário colocar você permanentemente em posição pronada, de bruços.
Se você for fumante, hipertenso, sedentário, diabético, asmático, portador de alguma comorbidade ou simplesmente estiver acima do peso, tudo se agravará severamente contra você.
É um sofrimento imenso!
Algumas pessoas se recuperam em casa, enquanto outras não se recuperam facilmente, outras são assintomáticas e outras morrem. Cargas virais diferentes, cepas diferentes do vírus, formas variadas e não totalmente conhecidas de contaminação e de recontaminação, risco de perda parcial da função pulmonar (risco de fibrose), feridas em cicatrização dentro dos pulmões.
Tudo isso faz parte do universo de situações que você não pode prever ou controlar. Elas ocorrem, em que pese você, em que pesem as suas fantasias, em que pese o seu romântico idealismo, em que pese a sua opinião sobre a relevante “segurança na colheita presencial da prova”. As pessoas são diferentes e reagem de modo diferente.
É bem prudente que você, antes de tomar a decisão de reiniciar as audiências presenciais com uma população não vacinada e estabilizada, primeiro conheça a realidade, não o discurso ou a fantasia.
Nunca decida antes da instrução. Isso vale para a decisão judicial, mas também vale para preservar a sua vida.
Acredite: os sinais sonoros emitidos permanentemente pelas máquinas à sua volta numa cama de hospital incomodam muito mais do que a ferramenta de videoconferência para audiências…
E se você for bem forte, atleta de alto desempenho, jovem e sadio, ainda assim você mesmo poderá contaminar alguém da família que sofrerá as terríveis consequências.
Espero que o(a) Colega não considere rude esta mensagem, mas que compreenda que a realidade pode ser muito pior do que podemos imaginar (eu nem imaginava tanto!), e que este alerta expressa um sentimento de verdadeira consideração por você.
Com o abraço do Colega,
Rafael E. Pugliese Ribeiro
*Publicamos o texto na íntegra apenas com revisões ortográficas e gramaticais.
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