26 de novembro de 2008

Fernando Pessoa

Esta é a segunda parte de "Mensagem" de Fernando Pessoa. Estava em meu computador desde 2005, quando a Gracinha se interessou pelo tema e eu encontrei os versos...
 
São tão bonitos que vale a pena reproduzir.
 
Sent: Monday, November 21, 2005 12:49 PM


Jornal de Poesia - Fernando Pessoa

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Fernando Pessoa

II - Segunda Parte: Mar Portuguez


SEGUNDA PARTE / MAR PORTUGUEZ
    Possessio maris.


         I. O INFANTE

    Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
    Deus quis que a terra fosse toda uma,
    Que o mar unisse, já não separasse.
    Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

    E a orla branca foi de ilha em continente,
    Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
    E viu-se a terra inteira, de repente,
    Surgir, redonda, do azul profundo.

    Quem te sagrou criou-te portuguez..
    Do mar e nós em ti nos deu sinal.
    Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
    Senhor, falta cumprir-se Portugal!


    II. HORIZONTE

    O mar anterior a nós, teus medos
    Tinham coral e praias e arvoredos.
    Desvendadas a noite e a cerração,
    As tormentas passadas e o mistério,
    Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
    'Splendia sobre as naus da iniciação.

    Linha severa da longínqua costa -
    Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
    Em árvores onde o Longe nada tinha;
    Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
    E, no desembarcar, há aves, flores,
    Onde era só, de longe a abstrata linha

    O sonho é ver as formas invisíveis
    Da distância imprecisa, e, com sensíveis
    Movimentos da esp'rança e da vontade,
    Buscar na linha fria do horizonte
    A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte -
    Os beijos merecidos da Verdade.


    III. PADRÃO

    O esforço é grande e o homem é pequeno.
    Eu, Diogo Cão, navegador, deixei
    Este padrão ao pé do areal moreno
    E para diante naveguei.
    A alma é divina e a obra é imperfeita.
    Este padrão sinala ao vento e aos céus
    Que, da obra ousada, é minha a parte feita:
    O por-fazer é só com Deus.

    E ao imenso e possível oceano
    Ensinam estas Quinas, que aqui vês,
    Que o mar com fim será grego ou romano:
    O mar sem fim é português.

    E a Cruz ao alto diz que o que me há na alma
    E faz a febre em mim de navegar
    Só encontrará de Deus na eterna calma
    O porto sempre por achar.


    IV. O MOSTRENGO

     mostrengo que está no fim do mar
    Na noite de breu ergueu-se a voar;
    A roda da nau voou três vezes,
    Voou três vezes a chiar,
    E disse: «Quem é que ousou entrar
    Nas minhas cavernas que não desvendo,
    Meus tetos negros do fim do mundo?»
    E o homem do leme disse, tremendo:
    «El-Rei D. João Segundo!»

    «De quem são as velas onde me roço?
    De quem as quilhas que vejo e ouço?»
    Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
    Três vezes rodou imundo e grosso.
    «Quem vem poder o que só eu posso,
    Que moro onde nunca ninguém me visse
    E escorro os medos do mar sem fundo?»
    E o homem do leme tremeu, e disse:
    «El-Rei D. João Segundo!»

    Três vezes do leme as mãos ergueu,
    Três vezes ao leme as reprendeu,
    E disse no fim de tremer três vezes:
    «Aqui ao leme sou mais do que eu:
    Sou um povo que quer o mar que é teu;
    E mais que o mostrengo, que me a alma teme
    E roda nas trevas do fim do mundo,
    Manda a vontade, que me ata ao leme,
    De El-Rei D. João Segundo!»


    V. EPITÁFIO DE BARTOLOMEU DIAS

    Jaz aqui, na pequena praia extrema,
    O Capitão do Fim.  Dobrado o Assombro,
    O mar é o mesmo:  já ninguém o tema!
    Atlas, mostra alto o mundo no seu ombro.


    Vl. OS COLOMBOS

    Outros haverão de ter
    O que houvermos de perder.
    Outros poderão achar
    O que, no nosso encontrar,
    Foi achado, ou não achado,
    Segundo o destino dado.

    Mas o que a eles não toca
    É a Magia que evoca
    O Longe e faz dele história.
    E por isso a sua glória
    É justa auréola dada
    Por uma luz emprestada.


    VII. OCIDENTE

    Com duas mãos - o Ato e o Destino -
    DesvendAmos. No mesmo gesto, ao céu
    Uma ergue o fecho trêmulo e divino
    E a outra afasta o véu.

    Fosse a hora que haver ou a que havia
    A mão que ao Ocidente o véu rasgou,
    Foi a alma a Ciência e corpo a Ousadia
    Da mão que desvendou.

    Fosse Acaso, ou Vontade, ou Temporal
    A mão que ergueu o facho que luziu,
    Foi Deus a alma e o corpo Portugal
    Da mão que o conduziu.


    VIII. FERNÃO DE MAGALHÃES

    No vale clareia uma fogueira.
    Uma dança sacode a terra inteira.
    E sombras desformes e descompostas
    Em clarões negros do vale vão
    Subitamente pelas encostas,
    Indo perder-se na escuridão.

    De quem é a dança que a noite aterra?
    São os Titãs, os filhos da Terra,
    Que dançam na morte do marinheiro
    Que quis cingir o materno vulto
    - Cingiu-o, dos homens, o primeiro -,
    Na praia ao longe por fim sepulto.

    Dançam, nem sabem que a alma ousada
    Do morto ainda comanda a armada,
    Pulso sem corpo ao leme a guiar
    As naus no resto do fim do espaço:
    Que até ausente soube cercar
    A terra inteira com seu abraço.

    Violou a Terra. Mas eles não
    O sabem, e dançam na solidão;
    E sombras disformes e descompostas,
    Indo perder-se nos horizontes,
    Galgam do vale pelas encostas
    Dos mudos montes.


    IX. ASCENSÃO DE VASCO DA GAMA

    Os Deuses da tormenta e os gigantes da terra
    Suspendem de repente o ódio da sua guerra
    E pasmam. Pelo vale onde se ascende aos céus
    Surge um silêncio, e vai, da névoa ondeando os véus,
    Primeiro um movimento e depois um assombro.
    Ladeiam-no, ao durar, os medos, ombro a ombro,
    E ao longe o rastro ruge em nuvens e clarões.

    Em baixo, onde a terra é, o pastor gela, e a flauta
    Cai-lhe, e em êxtase vê, à luz de mil trovôes,
    O céu abrir o abismo à alma do Argonauta.


    X. MAR PORTUGUÊS

    Ó mar salgado, quanto do teu sal
    São lágrimas de Portugal!
    Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
    Quantos filhos em vão rezaram!
    Quantas noivas ficaram por casar
    Para que fosses nosso, ó mar!

    Valeu a pena? Tudo vale a pena
    Se a alma não é pequena.
    Quem quer passar além do Bojador
    Tem que passar além da dor.
    Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
    Mas nele é que espelhou o céu.


    XI. A ÚLTIMA NAU

    Levando a bordo El-Rei D. Sebastião,
    E erguendo, como um nome, alto o pendão
    Do Império,
    Foi-se a última nau, ao sol azíago
    Erma, e entre choros de ânsia e de presago
    Mistério.

    Não voltou mais. A que ilha indescoberta
    Aportou? Voltará da sorte incerta
    Que teve?
    Deus guarda o corpo e a forma do futuro,
    Mas Sua luz projecta-o, sonho escuro
    E breve.

    Ah, quanto mais ao povo a alma falta,
    Mais a minha alma atlântica se exalta
    E entorna,
    E em mim, num mar que não tem tempo ou 'spaço,
    Vejo entre a cerração teu vulto baço
    Que torna.

    Não sei a hora, mas sei que há a hora,
    Demore-a Deus, chame-lhe a alma embora
    Mistério.
    Surges ao sol em mim, e a névoa finda:
    A mesma, e trazes o pendão ainda
    Do Império.


    XII. PRECE

    Senhor, a noite veio e a alma é vil.
    Tanta foi a tormenta e a vontade!
    Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
    O mar universal e a saudade.

    Mas a chama, que a vida em nós criou,
    Se ainda há vida ainda não é finda.
    O frio morto em cinzas a ocultou:
    A mão do vento pode erguê-la ainda.

    Dá o sopro, a aragem - ou desgraça ou ânsia -
    Com que a chama do esforço se remoça,
    E outra vez conquistaremos a Distância -
    Do mar ou outra, mas que seja nossa!

21 de novembro de 2008

La Rioja, Espanha

Preparei este e-mail para a lista de discussão dos radioamadores de todo o mundo. Já se tornou um hábito sermos bem recebidos por nossos amigos de diversos países, não raras vezes, pessoas que conhecemos apenas e tão somente pelo rádio. La Rioja promete, com seus magníficos vinhos lastreados, principalmente, na uva tempranillo.

O tempo também promete, com temperaturas próximas do zero, dando maior impulso ao apetite e a degustação de bons vinhos.

O hotel foi indicação expressa de nossos vizinhos Vitor e Eliana. Com eles, degustamos recentemente um Conde de Los Andes 1999, em um almoço oferecido em sua casa. Que vinho!!


 

Segue o E-mail.


 

Minha esposa (PU2VYT) e eu viajaremos para La Rioja, Espanha, em 25.12.2008. Retornaremos ao Brasil em 03.1.2009. Ficaremos hospedados no Hotel Sercotel Portales em Logrono durante todo o período.

Temos algumas boas indicações sobre restaurantes (como Asador Emilio, por exemplo) e vinícolas. Gostaríamos de sugestões voltadas especialmente para o circuito não turístico, ou seja, os bons restaurantes e adegas que servem aos espanhóis tão somente.

E claro, de conhecer alguns radioamadores da região e que possam gastar parte de seu tempo conosco, talvez para um jantar ou uma garrafa de vinho.

Por favor, envie-nos um e-mail em private.

Obrigado.


 


 

My wife (PU2VYT) and I will travel for Rioja, Spain, next 25.12.2008. We will return to Brazil 03.1.2009. We will be housed in the Hotel Sercotel Portales at Logrono during all the period.

We have some good indications on restaurants (Asador Emilio, for example) and wineries. We would like suggestions directed especially to the non- tourist circuit, that is, the good restaurants and cellars that serve specially Spanish people.

And of course, perhaps know some ham radio ops from the region who can spend some time time with us, for a dinner or a bottle of wine.

Please, answer this one e-mail in private.

Thank you


 


 

Mi esposa (PU2VYT) y yo viajaremos para Rioja, Espana, en 25.12.2008. Volveremos al Brasil en 03.1.2009. Estaremos en el hotel Sercotel Portales en Logrono durante todo el periodo.

Tenemos algunas buenas indicaciones en restaurantes (Asador Emilio, por ejemplo) y vinicolas. Quisieramos las sugerencias dirigidas especialmente hacia el circuito no turistico, es decir, los buenos restaurantes y bodeas que sirven especialmente a los espanoles.

E claramente, a quizas sabe algunos radioaficionados de la región y que pueden pasar la parte de su tiempo con nosotros, para una cena o una botella de vino.

Responde en private, por favor.

Gracias.

14 de novembro de 2008

Direito

Para o jantar desta noite, com operadores do Direito, dois grandes vinhos.


 

Chablis de William Févre, 2005 (FRA), branco.

"ligeiramente mineral e revigorante, revelando maçã verde e notas de terra aliados a uma firme estrutura. Meio-paladar cremoso, antes de destacar, no retrogosto e ao final, notas de casca de grapefruit. Consumir até 2012. 89 pontos Wine Spectator".


 

Top 100 da Wine Spectator em 2007: Bierso El Castro de Valtuille, 2004 (ESP), tinto:

"Um tinto cheio, balanceado, com alluring aromas de amoras selvagens e pedras molhadas que carregam o paladar. Tem intensidade, e mesmo assim permanece gracioso, com tons florais e de especiarias culminando com um retrogosto frutado. Consumir até 2012. 25.000 caixas produzidas. 92 pontos Wine Spectator"


 

5 de novembro de 2008

De mal a pior


Recebi esse texto de um colega de trabalho. Tem muita gente grande precisando ler e compreender a mensagem. Profissionais que brincaram com minha vida tiveram educação mimada e não escutaram "Não" quando deveriam... E realmente, a cada dia que passa, percebo que ninguém mais aceita "Não" como resposta. É por isso que tudo vai de mal a pior.

 
O que pode criar um monstro?
O que leva um rapaz de 22 anos a estragar a própria vida e a vida de outras duas jovens por... Nada? Será que é índole? Talvez, a mídia? A influência da televisão? A situação social da violência? Traumas? Raiva contida? Deficiência social ou mental? Permissividade da sociedade?
O que faz alguém achar que pode comprar armas de fogo, entrar na casa de uma família, fazer reféns, assustar e desalojar vizinhos, ocupar a polícia por mais de 100 horas e atirar em duas pessoas inocentes? O rapaz deu a resposta: "ela não quis falar comigo". A garota disse não, não quero mais falar com você. E o garoto, dizendo que a amava, não aceitou um não.
Seu desejo idiota era mais importante. Não quero ser mais um desses psicólogos de araque que infestam os programas vespertinos de televisão, que explicam tudo de maneira muito simplista e falam descontextualizadamente sobre a vida dos outros sem serem chamados. Mas ontem, enquanto não conseguia dormir pensando nesse absurdo todo, pensei que o não da menina Eloá foi o único. Faltaram muitos outros nãos nessa história toda. Faltou um pai e uma mãe dizerem que a filha de 12 anos NÃO podia namorar um rapaz de 19. Faltou uma outra mãe e pai dizer que NÃO iria sucumbir ao medo e ir lá tirar o filho do tal apartamento, talvez até a puxões de orelha como a moda antiga. Faltou outros pais dizerem que NÃO iriam atender ao pedido de um policial maluco de deixar a filha voltar para o cativeiro de onde, com sorte, já tinha escapado com vida.
Faltou a polícia dizer NÃO ao próprio planejamento errôneo de mandar a garota de volta pra lá.
Faltou o governo dizer NÃO ao sensacionalismo da imprensa em torno do caso, que permitiu que o tal seqüestrador conversasse e chorasse compulsivamente em todos os programas de TV que o procuraram. É, simples assim: bastava um NÃO. Pelo jeito, a única que disse não nessa história, foi punida com uma bala na cabeça. O mundo está carente de Nãos. Vejo que cada vez mais os pais e professores morrem de medo de dizer não às crianças. Mulheres ainda têm medo de dizer não aos seus maridos (e alguns maridos, temem dizer não às esposas). Pessoas têm medo de dizer não aos amigos. Noras que não conseguem dizer não às sogras, chefes que não dizem não aos subordinados, gente que não consegue dizer não aos próprios desejos. E assim, são criados alguns monstros... Talvez alguns não cheguem a seqüestrar pessoas. Mas terão pequenos surtos quando escutarem um não, seja do guarda de trânsito, do chefe, do professor, da namorada, do gerente do banco... Essas pessoas acabam crendo que abusar é normal. E que é legal. Os pais dizem: "não posso traumatizar meu filho". E, não é raro ver alguns já tomando tapas de bebês com 1 ou 2 anos de idade. Outros, gastam o que não têm em brinquedos todos os dias e em festas de aniversário faraônicas para suas crias. Sem falar nos adolescentes.
Hoje em dia, é difícil ouvir alguém dizer:
Não, você não pode bater no seu amiguinho.
Não, você não vai assistir a uma novela feita para adultos.
Não, você não vai fumar maconha enquanto for contra a lei. Não, você não vai passar a madrugada na rua.
Não, você não vai dirigir sem carteira de habilitação.
Não, você não vai beber uma cervejinha enquanto não fizer 18 anos.
Não, essas pessoas não são companhias pra você.
Não, hoje você não vai ganhar brinquedo ou comer salgadinho e chocolate.
Não, aqui não é lugar para você ficar.
Não, você não vai faltar na escola sem estar doente.
Não, essa conversa não é pra você se meter.
Não, com isto você não vai brincar.
Não, hoje você está de castigo e não vai brincar no parque. Não, etc...
Crianças e adolescentes que crescem sem ouvir bons, justos e firmes NÃOS, crescem sem saber que o mundo onde vivem não é só deles. E aí, no primeiro não que a vida dá (e a vida dá muitos) surtam de vez.
Usam drogas.
Compram armas.
Transam sem camisinha.
Batem em professores.
Furam o pneu do carro do chefe.
Chutam mendigos e prostitutas na rua.
E daí por diante...
Não estou defendendo a volta da educação rígida e sem diálogo, pelo contrário... Acredito piamente que crianças e adolescentes tratados com um amor real, sem culpa, tranqüilo e livre, conseguirão entender perfeitamente uma sanção do pai ou da mãe, um tapa, um castigo, um NÃO. Intuem que o amor dos adultos pelas crianças não é só prazer - é também responsabilidade. E com certeza: "quem ouve uns Nãos de vez em quando, também aprende a dizê-los quando é preciso". Acaba aprendendo que é importante dizer não com respeito e firmeza, mesmo que sejam pessoas que nos amem. O "NÃO" protege, ensina e prepara as pessoas. Por mais que seja difícil, eu tento dizer não aos seres humanos que cruzam o meu caminho, quando acredito que é hora - e tento respeitar também os nãos que recebo.
Nem sempre consigo, mas tento... Acredito que é por aí que está a verdadeira prova de amor e da responsabilidade social. E, é também por aí, que estará o começo para a solução da violência e da insegurança, cada vez mais desmedida e absurda dos nossos dias. Penso nisso: A vida deve ser bela e que não pode ter monstros...
Abraços